para este texto, emprestei o termo utilizado por Ziraldo, no livro “Vovó delícia”, para descrever o que ele chama de “um novo ser que habita entre nós”. Contrastantes com as imagens tradicionais, aqui os personagens idosos mantêm uma velhice ativa, independente e autônoma, trabalhando, tendo um grupo de amigos, dançando em bailes e fazendo atividade física.
As imagens veiculadas nos quatro livros que apresentarei retratam integração social, flexibilidade cognitiva e produtividade profissional, compatíveis com as características de idosos que desfrutam de boas condições psicológicas, sociais e de saúde. Nas ilustrações, aparecem personagens com roupas contemporâneas, como: agasalhos e tênis; utilizando aparelhos como computador e walkman; andando de motocicleta; se maquiando e beijando-se na boca.
O livro “Gente bem diferente” (MACHADO, A. M. São Paulo: Quinteto editorial, 2004) (capa: foto reprodução acima) começa com a conversa entre dois irmãos que questionam as imagens tradicionais das pessoas idosas, comparando-as aos seus avós. Assim, comentam um com o outro: “Rodrigo, você já viu algum dia a vovó de óculos, parecendo uma velhinha, com cabelo branco preso num rolinho no alto da cabeça, sentada na cadeira de balanço fazendo tricô e cochilando toda hora?”. Ao longo do texto, os netos seguem dialogando e apresentando suas observações: “A gente entra naquele banco e sempre encontra o vovô atrás da mesa assinando papéis, falando ao telefone. Sempre ocupado e importante”. No final, fica a mensagem de respeito aos diferentes modos de viver a velhice, com destaque para a valorização da atividade nesta fase do ciclo de vida.
Uma menina abre a história “Vovó delícia” (ZIRALDO. São Paulo: Melhoramentos, 1997) (capa: foto reprodução acima) descrevendo o apartamento de sua avó: muito incrementado, com um monte de quadros, porta-retratos, livros de arte e de poesia e uma foto enorme da época das passeatas. Para a neta, a avó é a pessoa mais enturmada que já viu, pois tem muitos amigos. A neta segue contando que sua avó sempre a leva para sair com seus amigos, até para ver shows, teatros e exposições de arte. Conta com orgulho que é a avó que a busca todos os dias na escola. Porém, um dia aparece para pegá-la, atrasado, seu avô. Sem responder onde está a avó, põe a menina no carro e a leva até um hospital. Lá, descobre que a avó havia sofrido uma parada cardíaca durante uma cirurgia que o autor não diz qual é. Então, a avó segue para Friburgo, para se recuperar e a menina fica um mês sem vê-la. No final da história, a menina leva outro susto ao ver sua avó chegar em casa, pois nada de mau havia acontecido: “Lá estava ela com a cara toda lisinha”. A história termina com uma fala da menina: “Meu maior desejo é fazer uma porção de clones da minha vó. Para que todas as meninas possam ter uma vó igual a minha”.
A história “Uma velhinha de óculos, chinelos e vestido azul de bolinhas brancas” (AZEVEDO, R. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 1998) (capa: foto reprodução acima) apresenta seis visões diferentes a respeito de uma mesma personagem idosa: uma mulher alta, de cabelos brancos, óculos e vestido, beirando os oitenta anos. Imagina-se que ela é uma escritora, uma feiticeira, uma dona de casa, uma professora de ginástica, uma viúva ou uma artista de teatro. Ao final, o autor interrompe a história, convidando o leitor para colar um espelho na última página, a fim de que o mesmo “entrasse um pouco na história” para entender que o nosso olhar, quando direcionado para pessoas idosas, pode gerar diferentes interpretações e julgamentos que acabam se transformando em atitudes negativas e preconceituosas.
Outro ótimo livro que trata deste tema é “Vovó Regina” (DRUMMOND, R. São Paulo: Scipione, 2002)(capa: foto reprodução acima). Nesta história, podemos vivenciar as aventuras de uma avó moderna, jovem, que usa minissaia, faz ginástica e tem a cabeça, como ela mesma diz, “cheia de idéias”.
Por que precisamos ler e contar estas histórias que apresentam estes “novos velhos”? Talvez porque ainda existam pessoas que pensam que avós de verdade são aqueles que têm óculos na ponta do nariz, vivem resmungando, usam coques nos cabelos, roupas de antigamente e cujas casas têm sempre aroma de bolos e biscoitos que estão no forno. Quem é que, em seu imaginário, pensou sobre a importância de divulgar a heterogeneidade da velhice? Os autores apresentados acima ousaram tentar.
E você? Identificou-se com estes personagens? Tem coragem suficiente para assumir uma nova postura diante daqueles que, em nossa sociedade esperam um comportamento padrão para os que possuem mais de 60 anos? Vamos lá! Sejamos Novos Velhos para que nossos netos possam aprender conosco e vir a ser Velhos Novos!
Pós-doutora em Gerontologia (USP), Doutora em Educação (UNICAMP) e Docente da Universidade Federal de São João Del-Rei (UFSJ) (clique aqui para falar com a colunista)